
A Literatura Infantil e Juvenil Hoje
05/08/2015 11:34Literatura Infanto Juvenil
PREFÁCIO
É imenso e multifacetado o universo da literatura infantil e juvenil. No Brasil, a produção cultural para a infância e juventude, em especial a literária, cresceu exponencialmente a partir de 1970. Cresceu em quantidade e qualidade, tornando cada vez mais refinado o vasto menu de obras. Vale lembrar que tal refinamento, tendo como norte o respeito ao imaginário infanto-juvenil, encontra em Monteiro Lobato o seu artesão primeiro e maior. Minhas lutas em prol da democratização da leitura no país tiveram início em 1972, logo depois que João Carlos Marinho escrevera a obra "O Caneco de Prata" (1971), tida por muitos estudiosos como o marco principal do movimento de renovação da literatura infantil brasileira na era pós-Lobato.
Por isso mesmo, como pesquisador das práticas de leitura, venho acompanhando a produção dentro dos limites de minhas possibilidades e sempre muito frustrado por não ser capaz de acompanhar a verdadeira avalanche de lançamentos dessa área. Ler, conhecer e entender as obras - se possível as boas - de literatura infantil e juvenil é dever de ofício de todos os professores do ensino fundamental e médio. Isto porque eles são mediadores e informantes privilegiados de leitura junto aos estudantes. Considerando um pouco da realidade vivida pela infância brasileira, eu diria que os professores são, hoje em dia, os principais agentes de promoção da leitura junto às crianças. Bem mais do que a família e outros organismos sociais. Por isso mesmo, as atividades de fomento e de orientação da leitura exigem dos mestres um adequado repertório de conhecimentos sobre universo da literatura infantil e juvenil, os seus diferentes gêneros, autores, configurações, suportes, etc.
A presente coletânea reúne 17 trabalhos que penetram o universo da literatura infantil e juvenil por diferentes ângulos. A obra permite um aprofundamento e uma adensamento no nosso conhecimento a respeito desse imenso universo que leva as crianças e os jovens a movimentarem a sua fantasia durante as práticas de recriação imaginativa que são próprias das interações com os textos literários. Na leitura que fiz para a elaboração deste prefácio, consegui perceber quatro eixos em torno dos quais giram as produções dos autores. Certamente que esses eixos, produtos de minha interlocução com os 17 textos, não esgotam a riqueza e amplitude da obra - outros olhares, talvez mais sensíveis do que o meu, poderão encontrar outros núcleos de significação e de inter-relacionamento das reflexões aqui costuradas.
Evolução da Literatura Infantil e Juvenil - A coletânea se abre com um texto de natureza histórica, que caracteriza as mudanças ocorridas na produção literária para crianças ao longo do tempo - um texto específico, voltado para a realidade brasileira, puxando os fios da história e mostrando a memória até agora constituída. Todos os demais artigos, indistintamente, introduzem os seus temas com base numa visão panorâmica da história da literatura infantil no nosso país ou no mundo. A perspectiva histórica fornece o devido suporte para uma compreensão segura das transformações da literatura na direção de diálogos mais criativos com as crianças ao longo do tempo. Monteiro Lobato Revisitado - Quatro artigos focam diretamente o rico manancial de Monteiro Lobato, ou aprofundando as características dos densos personagens por ele criados ou mostrando o alcance das suas adaptações de contos estrangeiros ou, ainda, esmiuçando aspectos inusitados de suas obras. Nestes termos, esses trabalhos permitem aquilatar mais abrangentemente a importância de Lobato para o desenvolvimento da literatura infantil brasileira. Estudo de Autores Específicos - Marina Colasanti, Lygia Bojunga Nunes, Roger Mello, Laura Ingalls Wilder, Ricardo Azevedo, J. K. Rowling e Manoel de Barros são rigorosamente estudados no transcorrer da coletânea, permitindo a descoberta de novas idéias para a interpretação de suas obras. As abordagens diferenciadas e inéditas dos estudiosos revelam uma ampla variedade de possibilidades de significação: mitologia, polifonia, ideologia, oralidade, intertextualidade, etc., fazendo ver aquilo que por vezes nos passa despercebido no acervo de obras desses autores. Literatura Infantil, Escola e Ensino - Ainda que todos os artigos da coletânea tenham no professor um leitor privilegiado, pelo menos três trabalhos tratam especificamente da relação entre leitura da literatura e a docência. Dentre os aspectos a destacar, coloca-se aquele voltado à maneira pela qual a escola é retratada em obras de literatura infantil e juvenil. Dois outros, também significativos, apontam para questões relacionadas ao ensino da intertextualidade e à imagem do alimento na literatura. Recomendo, com todas as minhas forças e energias, a leitura desta coletânea por parte de todos aqueles que lutam por uma infancia-juventude mais crítica e mais criativa no território nacional. Retomando um conceito de Walter Benjamim, citado nesta obra, a "experiência pobre" não pode mais residir na esfera do magistério brasileiro, sob o risco de reproduzirmos, ano a ano, uma formação cultural rasteira das nossas crianças e jovens. No meu ponto de vista, a leitura, seja deste livro, seja de qualquer outro seriamente elaborado, permite a reelaboração e o enriquecimento das nossas
experiências e das nossas visões de mundo. Nestes termos, visitar os lugares visitados pelos autores deste conjunto de reflexões pode significar um ganho de discernimento e uma ponte mais segura para a tomada de decisões a respeito do porquê, do o quê e do como dispor ou ofertar determinadas obras – e não outras - para a apreciação das crianças e dos jovens brasileiros.
EZEQUIEL THEODORO DA SILVA
Campinas, fevereiro de 2010.
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